Ao contrário do Quénia, a Justiça angolana não seria capaz de resolver o impasse eleitoral no país. Decisões judiciais seriam tomadas com base numa “dívida política das pessoas que trabalham nestas instituições”.
Por Manuel Luamba (*)
A Justiça de Angola tem um caminho longo a percorrer até que possa ser tomada no país uma decisão semelhante à do Supremo Tribunal do Quénia, que anulou na semana passada o resultado das eleições de 8 de Agosto, alegando irregularidades no processo eleitoral que reelegeu o Presidente Uhuru Kenyatta.
Isto é o que pensa o jurista e jornalista angolano William Tonet, que acusa o Tribunal Constitucional em Luanda de agir de forma parcial na resolução do impasse político entre a oposição e a Comissão Nacional Eleitoral (CNE).
“A dificuldade é haver um tribunal imparcial e isento. Essa é a única dificuldade. Se houvesse um tribunal independente, esta questão já estaria ultrapassada porque o tribunal mandaria que a CNE se conformasse com a lei”.
A CNE considerou este sábado (02.09) “improcedentes, ineptas e extemporâneas” as reclamações apresentadas pela União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) e pela Convergência Ampla de Salvação de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE), sobre supostas irregularidades nos resultados provinciais definitivos.
William Tonet desvaloriza a posição do órgão eleitoral e diz que a comissão não tem legitimidade para o efeito. “A CNE não é séria, não é isenta e não é imparcial. A CNE descredibiliza-se todos os dias por causa da sua veia ‘partidocrata’. A CNE não é um órgão independente, logo, não tem legitimidades de atirar pedras quando o seu telhado é de vidro”.
A oposição angolana uniu-se para reclamar a contagem dos votos da CNE. UNITA, CASA-CE, Partido de Renovação Social (PRS) e Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA) negam os resultados já escrutinados e exigem a recontagem dos votos nas provinciais.
O político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), João Pinto, diz que posição tomada este domingo por estes partidos visa somente descredibilizar as instituições angolanas: “Fazem isso para tentar fazer passar a retórica da fraude. Começou com registo eleitoral, com MAT (Ministério da Administração do Território), recorreu ao Tribunal Constitucional, perdeu. A oposição continua com a narrativa de tentar desacreditar as instituições. É um patriotismo invertido da UNITA e da oposição, infelizmente”.
As decisões do Tribunal Constitucional e da CNE são criticadas por alguns analistas por serem tomadas alegadamente de forma parcial. De acordo com o politólogo Agostinho Sicato, não há uma “interferência política”, mas “uma dívida política das pessoas que trabalham nestas instituições”.
“Ou seja, os juízes que trabalham no Tribunal Constitucional grande parte deles tem um cartão. Tem um passado com o partido que está no poder”, afirma Sicato.
Os oposicionistas dizem ter provas de que houve manipulação dos resultados, através da contagem paralela efectuada. O politólogo Agostinho Sicato desafia o maior partido da oposição, a UNITA, a tornar público a sua contagem para se dissipar algumas dúvidas.
“Eles contestam resultados e eles não apresentam outros resultados. Eu estou a falar concretamente da UNITA, por exemplo. A UNITA diz que tem resultados paralelos, mas até hoje não vem a público apresentar os seus resultados paralelos. Isso não ajuda”, conclui.
(*) DW – África
Foto: Folha 8
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